Futebol Praia Masculino

Madjer: "o futebol de praia está bem entregue"

Futebol Praia - Seleção A

Capitão na conquista de Espinho, é o único luso presente nos três mundiais da seleção

2001, 2015 e 2019 têm um ponto em comum: Madjer, "o rei das areias".

Para muitos uma lenda e o melhor jogador de todos os tempos de futebol de praia, foi o capitão dos Heróis da Areia na célebre conquista do primeiro mundial sob a chancela da FIFA, a 19 de julho do 2015, em Espinho.

Em entrevista ao fpf.pt, o atual coordenador da modalidade na Federação Portuguesa de Futebol, fala-nos de como viveu essa importante vitória e a transformação resultante desse momento para o futebol de praia português.

10 anos do primeiro mundial FIFA

FPF: A jogar em casa, sentiam a expectativa muito alta?

Madjer: “Nós sentíamos e sentimos sempre uma energia completamente diferente. Tínhamos o intuito de conquistar, como em todas as provas, sabíamos que a questão de jogar em casa podia ter um fator positivo, como também podia ter um fator negativo. A questão de jogarmos em casa, sermos catapultados para uma vitória no Campeonato do Mundo, através dos adeptos, mas também poderia ter o efeito contrário de que era realmente não começar a correr como nós gostávamos, por estarmos a jogar em casa termos essa expectativa muito alta e depois toda aquela união que podia ter um impacto positivo na equipa poderia não ter.”

FPF: A fase de grupos começou coma uma vitória, depois uma derrota no segundo abalou ou não algum ânimo?

Madjer: “Eu acho que o segundo jogo contra o Senegal foi sem dúvida o ponto de viragem na nossa caminhada vitoriosa. Isto porque nós entramos bem com uma vitória contra o Japão, o Senegal que na altura era um desconhecido do futebol de praia, era aquela seleção que ninguém imaginava que Portugal perdesse e a verdade é que isso aconteceu. Vimos que já não poderíamos ir pelos nomes das seleções, mas tínhamos de entrar para todos os jogos da mesma forma, com a mesma atitude para não termos surpresas e, inclusive, tivemos depois uma reunião de jogadores onde fizemos toda a retrospetiva de tudo o que tinha acontecido e do que tínhamos de fazer para melhor e depois a verdade é que correu muito bem.”

FPF: Quartos-de-final diante da Suíça passados com sucesso, depois uma meia-final contra a Rússia, um dos grandes nomes à época, foi o que faltava para chegarem à final?

Madjer: “A Rússia era aquele jogo onde todos consideravam como uma final antecipada. Nós conhecíamos bem a equipa deles, tal como a Rússia conhecia a nossa, tínhamos muitos jogadores que jogavam no campeonato russo e que tinham um profundo conhecimento do futebol praticado pela seleção deles, o que também acontecia do outro lado. Sabíamos que o jogo se decidiria no detalhe e a verdade é que foi isso que aconteceu. Entrámos muito concentrados, sabíamos que neste tipo de jogos tínhamos de entrar a 200% ao nível da concentração e, na verdade, foi isso que aconteceu e conseguimos a vitória.”

FPF: Falemos agora do dia da final, como viveram o percurso até ao estádio com aquela multidão? Sentiram algum tipo de nervosismo?

Madjer: “Sentíamos que não queríamos falhar com todo um Portugal que nos estava a apoiar e o tal friozinho na barriga que todos sentimos era realmente esse, o de saber que podíamos fazer história e ficar eternamente marcados nessa mesma história do futebol de praia e desporto nacional. Ainda para mais em casa, não queríamos que as pessoas tivessem sido iludidas, porque estando numa final em casa e senão a ganhássemos ia ser um banho de água fria para todos. A verdade é que esse friozinho veio depois sendo ultrapassado consoante o jogo foi rolando.”

FPF: No jogo ficou demonstrado a superioridade portuguesa. Entende que aquela final foi o resultado do trabalho realizado nos anos anteriores e da constante evolução da modalidade?

Madjer: “Nós na primeira edição FIFA chegamos à final e fizemos o que todos apelidaram como impossível, que era eliminar o Brasil nas meias-finais e depois perder na final, nas grandes penalidades, diante da França. É um dos grandes desgostos de todos os jogadores que passaram por aquele mundial e todas estas gerações que souberam o que aconteceu não queriam voltar a repetir. Por tudo isso, a final de 2015 foi uma demonstração do trabalho e da grande qualidade que temos a nível nacional, ao nível dos atletas. Sabíamos que seria um ponto de viragem ao nível da forma como as pessoas nos iam começar a ver, que é totalmente diferente quando não temos títulos, quando os tentamos atingir e, neste caso, quando atingimos vimos que houve ali uma mudança de paradigma.”

FPF: Muitos caracterizaram este mundial como o nascer de uma nova geração. Com a saída do Alan nesta final, o Madjer ficou como o mais experiente e eterno capitão, numa equipa que já contava com jogadores como o Jordan Santos, Rui Coimbra, Bê e Léo Martins, que até hoje se mantêm. Sente que a preocupação em manter certos jogadores chaves ajudam na renovação e no melhor entrosamento de novos jogadores?

Madjer: “O nosso trabalho tem sido feito sempre desta forma, uma mescla de jogadores mais velhos com outros mais novos, até por causa da integração e esse trabalho tem sido feito ao longo das gerações. Não é um trabalho fácil, não é um trabalho de encontrarmos ali ao virar da esquina, como se diz na gíria, um jogador para estar no patamar de seleção nacional. Existem muitos que têm de ser trabalhados simultaneamente com o apoio dos mais velhos, não só pela parte dentro de campo, mas também fora de campo temos todos um papel importante na formação desses atletas.”

FPF: No final, quando ouviu a buzina no jogo da final, qual foi o sentimento?

Madjer: “É um verdadeiro mix de emoções, ainda por cima a jogar em casa olhava à minha volta e ia a alegria das pessoas, via a alegria dos meus colegas, do Mister Narciso, de toda a família FPF. E depois quando assentámos um pouco mais as ideias é que percebemos o que fizemos, só mesmo depois de sairmos do recinto, porque até à saída do estádio foi uma loucura. Eu por exemplo ainda não acreditava que era campeão do mundo, estava ali um pouco perdido em termos de emoções, não sabia se havia de rir ou de chorar, quem é que haveria de abraçar, mas foi dos momentos mais marcantes da minha vida.”

FPF: Existe imagens icónicas do Madjer a festejar com o filho, o Bernardo. Como qualquer criança que estava a ver o pai a conquistar o mundo, acha que aquele jogo despertou ainda mais a paixão pela modalidade?

Madjer: “Sem dúvida e nós temos vários exemplos, como o do meu filho como do Rúben Brilhante, que nessa altura estava a dar os seus primeiros passos em termos de formação de futebol de praia e mesmo o próprio Rúben afirma que aquele momento foi marcante e que foi o momento onde ele realmente decidiu apostar no futebol de praia. O maior legado que podemos deixar é o facto de conseguirmos colocar mais crianças a praticar o desporto, que depois acabaram por ficar na modalidade e acho que isso é a maior vitória que nós temos.”

FPF: Na altura já capitão, o único jogador da história presente nos três títulos mundiais (2001, 2015 e 2019) e agora como coordenador da modalidade, na FPF, como vê a evolução do futebol de praia em Portugal?

Madjer: “Eu vejo a modalidade num crescendo e os números comprovam falam por si. O aumento do número de praticantes, o aumento do número de clubes, o aumento de associações distritais e regionais envolvidas com o futebol de praia. Ainda temos um longo trabalho pela frente, mas o que eu acho que é de louvar é que cada vez mais temos jogadores mais novos a praticarem futebol de praia e o futuro a eles pertence. O futebol de praia está bem entregue, tem muitos jovens a querer praticar, cada vez mais as equipas estão a querer aposta nesses jovens talentos e quem fica a ganhar são os selecionadores nacionais.”

 


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